No dia de ontem, o jornal O Globo publicou um editorial no qual expressa todo o seu pavor em relação à entrada da Venezuela no Mercosul. Acostumado a jogar com o medo, para hegemonizar ideologicamente o pensamento da classe média branca paulista, desta vez, "O Globo" escolhe como alvo a burguesia nacional.
Peguei o texto do editorial e coloquei meus apontamentos em azul, parágrafo a parágrafo.
Argumento Falso
(Editorial de O Globo - 04/11/2009)
Vitoriosa na Comissão de Relações Exteriores do Senado, a proposta do governo de que a Venezuela de Hugo Chávez seja membro permanente do Mercosul precisa ser discutida com mais profundidade antes de ir ao plenário da Casa. Estava correta a linha adotada pelo relator do assunto na comissão, senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).
Correta segundo o entendimento da Globo, "para variar", um tucano.
A sensata recomendação para que os senadores rejeitassem a proposta, por causa do real teor antidemocrático do regime bolivariano chavista, foi, entretanto, rechaçada por 12 votos a cinco, pelo rolo compressor do Planalto movido a alguns argumentos enganosos.
“Real teor antidemocrático”???
Nunca aconteceram tantos debates acerca de estado, sociedade e governo na nação venezuelana; em cada bairro de Caracas, vilarejo distante ou chão de fábrica as pessoas discutem sobre temas nacionais, internacionais e também sobre as suas demandas sociais e materiais cotidianas. Os círculos bolivarianos e outras formas de organização popular constituem um rico e efervescente processo de multiplicação do exercício da democracia.
No aspecto político, foi construída a risível interpretação de que é possível separar Estado de governo. Poderia em algum outro lugar do mundo, menos na Venezuela, onde Chávez executa com método um projeto autoritário, vertical, com ele no vértice mais alto.
“Poderia em algum outro lugar do mundo”
Aonde? Na Colômbia, onde existe um narco-governo que pretende perpetuar-se no poder?
“Projeto autoritário”?
Lembrando novamente, a Venezuela vive a maior fase democrática de toda sua história, isso é fato.
Fora isso , o cidadão Hugo Rafael Chávez Frias, foi colocado na presidência democraticamente, pelo povo venezuelano. Aliás, Chávez chegou ao poder dentro das regras do jogo da democracia liberal burguesa, de caráter representativo. Venceu uma série de eleições e plebiscitos aonde a direita teve todas as condições de organização para disputa.
Não faltam tinturas fascistas na criação de milícias armadas subordinadas ao caudilho.
A doutrina militar venezuelana está compreendendo o papel da guerra assimétrica no combate a exércitos invasores com poderio superior. É pública e notória a hostilidade por parte dos Estados Unidos ao governo venezuelano, é pública e notória a atividade paramilitar dos setores conservadores e entreguistas venezuelanos.
O presidente Chávez não tem interesse em virar um novo Allende, o povo da Venezuela não tem interesse em ser subjugado por um novo Pinochet.
Fascista é a política de Álvaro Uribe, o qual é blindado pela grande mídia, cuja família já teve negócios com El Patrón Pablo Escobar. Governo fascista e entreguista, que alimenta esquadrões da morte que assassinam sindicalistas, camponeses e ativistas democráticos todos os dias. Mas disso, a mídia da Família Marinho não fala, afinal, enxerga, neste modelo de governo, um porto seguro para defesa de seus interesses de classe.
Não é a toa que as organizações globo experimentaram um vertiginoso crescimento durante a ditadura militar brasileira.
Outro argumento, este econômico, é que Chávez no Mercosul abriria ainda mais espaços para o Brasil no mercado venezuelano.
Isso é fato, não é só argumento.
Foi visível o lobby de empresas brasileiras no Senado a favor das intenções palacianas.
As contradições da classe dominante, às vezes, são muito engraçadas, é claro que o capital produtivo brasileiro vislumbrou belas possibilidades para si num país que experimenta crescimento, em todos os sentidos, e que precisa, urgentemente, colocar em funcionamento uma série de políticas de desenvolvimento estrutural. Para desespero da família Marinho, o empresariado brasileiro quer fazer negócios com a Revolução Bolivariana.
Os defensores da proposta oficial citam dados sobre o grande crescimento das exportações brasileiras: de US$ 537 milhões em 1999 passaram para US$ 5,1 bilhões no ano passado, com um superávit robusto de mais de US$ 2 bilhões.
Isso é fato.
Pressupõe-se que a entrada da Venezuela no Mercosul é condição necessária para que as exportações brasileiras continuem a crescer. Falso argumento, pois as vendas brasileiras para a Venezuela cresceram por se beneficiar de um acordo de livre comércio assinado pelo Mercosul com aquele país - e nada impede que continuem a se expandir.
Agora este editorial se superou; dentro de uma falácia doentia e burra, tenta-se revisar a lógica da diplomacia e da estratégia política internacional.
Afinal, o que eles querem dizer?
Que as exportações brasileiras vão encolher com a entrada venezuelana no bloco?
Que as exportações brasileiras à Venezuela vão crescer mais com a república bolivariana fora do Mercosul do que dentro?
Será que o diário da família Marinho, em sua sanha, não denota algum tipo de “desespero de elite de nação subdesenvolvida” em relação a decisões políticas que podem desembocar num modelo de desenvolvimento endógeno de um grande bloco latino-americano?
Outra coisa é permitir que Chávez participe, com poder de veto, da união aduaneira do Mercosul, em que todos os participantes precisam praticar uma tarifa externa comum (TEC) e só podem fechar acordos comerciais em bloco. Se Chávez desejar, o Mercosul não fechará um sequer desses acordos, vitais para o Brasil.
Empresários que hoje trabalham para facilitar a entrada da Venezuela no mercado comum deverão se arrepender - caso tenham êxito - , quando, por exemplo, a longa negociação que o Mercosul empreende com a União Europeia, estratégica para quem deseja aumentar a participação no comércio mundial, for suspensa de vez por um veto bolivariano.
E eis que o editorial de O Globo encerra-se com um pacote repleto de ameaças.
É interessante notar que as ameaças, desta vez, dirigem-se menos à classe média branca urbana e muito mais à burguesia nacional, sobretudo ao capital produtivo, que quer ir à Venezuela construir portos, estradas, pontes, indústrias etc.
Será que o “desespero de elite de nação subdesenvolvida” denotada pelas organizações Globo não estão refletindo(mais do sua contrariedade a um mercado comum latino-americano) o medo de que o espectro bolivariano, que ronda o continente, chegue com força em terras brasileiras?