segunda-feira, 31 de maio de 2010

Cherge do Bier: Israel ataca

Muito petróleo e pouco urânio no Irã

Por
Haroldo Lima *

Não deixa de ser instigante compreender por que os Estados Unidos não aceitam os termos de um acordo que no geral incorpora o que eles exigiam do Irã pouco tempo atrás, quanto ao controle do urânio enriquecido

A má vontade com o Irã, que leva até à desconsideração dos bem sucedidos esforços diplomáticos de duas nações soberanas, Brasil e Turquia, ambos membros do Conselho de Segurança da ONU, revela, ou sugere, a existência de algo mais que o `problema nuclear` contrariando os interesses americanos. A visita que fiz à província de Fars, no Irã, por ocasião da visita do presidente Lula àquele país, deu-me elementos para uma percepção mais aguda da imediata reação americana no caso.

Primeiro, fixemos que Irã é o nome atual da Pérsia e que Fars é a província onde está Pasárgada, a primeira capital do antigo império persa, fundado por Ciro II, o Grande – imperador persa que conquistou a Babilônia em 539 a.C. e libertou os judeus para reconstruírem Jerusalém. A cidade, onde se encontra a tumba de Ciro, passou a ser mais conhecida no Brasil a partir do poema de Manuel Bandeira Vou-me embora pra Pasárgada.

Pois é em Fars, região prenhe de história e simbolismo, que os iranianos me levaram para conhecer a Zona Econômica Especial de Energia, um enorme complexo projetado para 24 fábricas de processamento de gás e 23 usinas petroquímicas – estando, algumas, já em funcionamento. O projeto é apresentado como sendo, ou será, a maior concentração no planeta de fábricas para transformação de gás natural em eteno, propeno e demais petroquímicos.

Em síntese, tudo está planejado e sendo feito para transformar o Irã de grande exportador de petróleo e gás in natura em grande processador desses hidrocarbonetos e exportador de produtos petroquímicos, de alto valor agregado. A China, nesse e em outros projetos, estaria investindo cerca de US$ 70 bilhões.

O que está previsto, além do que já está concluído, é muito arrojado. A Zona Econômica Especial de Energia está sendo instalada em um setor de Fars onde, há poucos anos, só existia deserto e mar. Hoje, além das amplas instalações industriais, há projetos urbanísticos, edifícios, farta plantação de árvores especiais, um aeroporto internacional. Uma montanha de areia e pedra, situada defronte do núcleo da Zona, está sendo transplantada para o mar, que está sendo aterrado em grandes dimensões, e onde já está operando, e ainda se encontra em expansão, um porto com grande poder de atracação.

Politicamente, a Zona Especial funciona de forma autônoma, com um comitê dirigente que inclui funcionários do Estado e presidentes de algumas das grandes empresas que lá atuam. Até a autorização para entrada de visitante estrangeiro pode ser conseguida lá mesmo, sem intervenção de Teerã.

O que já opera na Zona Econômica Especial de Energia – e, mais ainda, o que está previsto nos projetos em execução – envolve muitos equipamentos, tecnologia avançada, muita construção civil e, sobretudo, o controle de enorme quantidade de hidrocarbonetos, oriunda do gás natural, a ser usado como matéria-prima para as petroquímicas.

Se levarmos em conta que o Irã detém a segunda maior reserva de petróleo e de gás do mundo – 138 bilhões de barris de petróleo e 187 bilhões de barris de gás, segundo dados de 2008 (o Brasil tem 13 bilhões de barris de petróleo, o pré-sal, algo em torno de 50 bilhões, e 2,3 bilhões de barris de gás) – produz 4,4 milhões de barris de petróleo por dia (o Brasil produz 2 milhões) e que tudo isso, repito, o muito que já está feito e o maior ainda que está planejado, não tem qualquer participação americana, percebe-se que algo mais deve estar tirando o sono dos EUA do que a hipotética ameaça advinda do acesso do Irã a urânio enriquecido.

* Haroldo Lima é diretor-geral da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis)

Reproduzido de AEPET

terça-feira, 25 de maio de 2010

10 Estratégias de manipulação midiática

Retirado do excelente Blog O Partisan


O lingüista estadunidense Noam Chomsky elaborou a lista das “10 estratégias de manipulação” das elites capitalistas, através da mídia:

1- A ESTRATÉGIA DA DISTRAÇÃO.

O elemento primordial do controle social é a estratégia da distração que consiste em desviar a atenção do público dos problemas importantes e das mudanças decididas pelas elites políticas e econômicas, mediante a técnica do dilúvio ou inundações de contínuas distrações e de informações insignificantes.

A estratégia da distração é igualmente indispensável para impedir ao público de interessar-se pelos conhecimentos essenciais, na área da ciência, da economia, da psicologia, da neurobiologia e da cibernética. “Manter a atenção do público distraída, longe dos verdadeiros problemas sociais, cativada por temas sem importância real. Manter o público ocupado, ocupado, ocupado, sem nenhum tempo para pensar; de volta à granja como os outros animais (citação do texto 'Armas silenciosas para guerras tranqüilas')”.

2- CRIAR PROBLEMAS, DEPOIS OFERECER SOLUÇÕES.

Este método também é chamado “problema-reação-solução”. Cria-se um problema, uma “situação” prevista para causar certa reação no público, a fim de que este seja o mandante das medidas que se deseja fazer aceitar. Por exemplo: deixar que se desenvolva ou se intensifique a violência urbana, ou organizar atentados sangrentos, a fim de que o público seja o mandante de leis de segurança e políticas em prejuízo da liberdade. Ou também: criar uma crise econômica para fazer aceitar como um mal necessário o retrocesso dos direitos sociais e o desmantelamento dos serviços públicos.

3- A ESTRATÉGIA DA GRADAÇÃO.

Para fazer com que se aceite uma medida inaceitável, basta aplicá-la gradativamente, a conta-gotas, por anos consecutivos. É dessa maneira que condições socioeconômicas radicalmente novas (foram impostas durante as décadas de 1980 e 1990: Estado mínimo, privatizações, precariedade, flexibilidade, desemprego em massa, salários que já não asseguram ingressos decentes, tantas mudanças que haveriam provocado uma revolução se tivessem sido aplicadas de uma só vez.

4- A ESTRATÉGIA DO DEFERIDO.

Outra maneira de se fazer aceitar uma decisão impopular é a de apresentá-la como sendo “dolorosa e necessária”, obtendo a aceitação pública, no momento, para uma aplicação futura. É mais fácil aceitar um sacrifício futuro do que um sacrifício imediato. Primeiro, porque o esforço não é empregado imediatamente. Em seguida, porque o público, a massa, tem sempre a tendência a esperar ingenuamente que “tudo irá melhorar amanhã” e que o sacrifício exigido poderá ser evitado. Isto dá mais tempo ao público para acostumar-se com a idéia de mudança e de aceitá-la com resignação quando chegue o momento.

5- DIRIGIR-SE AO PÚBLICO COMO CRIANÇAS DE BAIXA IDADE.

A maioria da publicidade dirigida ao grande público utiliza discurso, argumentos, personagens e entonação particularmente infantis, muitas vezes próximos à debilidade, como se o espectador fosse um menino de baixa idade ou um deficiente mental. Quanto mais se intente buscar enganar ao espectador, mais se tende a adotar um tom infantilizante. Por quê?

“Se você se dirige a uma pessoa como se ela tivesse a idade de 12 anos ou menos, então, em razão da sugestionabilidade, ela tenderá, com certa probabilidade, a uma resposta ou reação também desprovida de um sentido crítico como a de uma pessoa de 12 anos ou menos de idade (ver “Armas silenciosas para guerras tranqüilas”)”.

6- UTILIZAR O ASPECTO EMOCIONAL MUITO MAIS DO QUE A REFLEXÃO.

Fazer uso do aspecto emocional é uma técnica clássica para causar um curto circuito na análise racional, e por fim ao sentido critico dos indivíduos. Além do mais, a utilização do registro emocional permite abrir a porta de acesso ao inconsciente para implantar ou enxertar idéias, desejos, medos e temores, compulsões, ou induzir comportamentos.

7- MANTER O PÚBLICO NA IGNORÂNCIA E NA MEDIOCRIDADE.

Fazer com que o público seja incapaz de compreender as tecnologias e os métodos utilizados para seu controle e sua escravidão. “A qualidade da educação dada as classes sociais inferiores deve ser a mais pobre e medíocre possível, de forma que a distância da ignorância que paira entre as classes inferiores às classes sociais superiores seja e permaneça impossíveis para o alcance das classes inferiores (ver ‘Armas silenciosas para guerras tranqüilas’)”.

8- ESTIMULAR O PÚBLICO A SER COMPLACENTE NA MEDIOCRIDADE.

Promover ao público a achar que é moda o fato de ser estúpido, vulgar e inculto.

9- REFORÇAR A REVOLTA PELA AUTOCULPABILIDADE.

Fazer o indivíduo acreditar que é somente ele o culpado pela sua própria desgraça, por causa da insuficiência de sua inteligência, de suas capacidades, ou de seus esforços. Assim, ao invés de rebelar-se contra o sistema econômico, o individuo se auto-desvalida e culpa-se, o que gera um estado depressivo do qual um dos seus efeitos é a inibição da sua ação.

10- CONHECER MELHOR OS INDIVÍDUOS DO QUE ELES MESMOS SE CONHECEM.

No transcorrer dos últimos 50 anos, os avanços acelerados da ciência têm gerado crescente brecha entre os conhecimentos do público e aquelas possuídas e utilizadas pelas elites dominantes. Graças à biologia, à neurobiologia e à psicologia aplicada, o “sistema” tem desfrutado de um conhecimento avançado do ser humano, tanto de forma física como psicologicamente. O sistema tem conseguido conhecer melhor o indivíduo comum do que ele mesmo conhece a si mesmo. Isto significa que, na maioria dos casos, o sistema exerce um controle maior e um grande poder sobre os indivíduos do que os indivíduos a si mesmos.

sábado, 22 de maio de 2010

Fracasa manifestação contra Cuba em Washington



Em Castelhano

Este sábado casi se dió un enfrentamiento ante la Sección de Intereses de Cuba en Washington. Casi, porque la convocación a una manifestación que pretendía ser masiva falló de forma espectacular, mientras que grupos de solidaridad con Cuba por mucho excedieron la ínfima representación de los manifestantes opuestos.
La actividad estaba convocada para las 11:30 am. Pasada la una de la tarde llegaron dos contrarrevolucionarios, los primeros en asistir, que en número crecieron a un máximo de cuatro (4), aunque, de estos, uno se retiró casi enseguida. Del otro lado de la calle, un variado y combativo contingente les instaba a los primeros a retirarse.
Las radios locales en español y la cadena televisiva Univision habían reiterado el llamado a la manifestación ante la Sección cubana. También por correo electrónico se había propagado la cita. Entre los presentes en solidaridad con la Sección se veían personas blancas y negras de Estados Unidos, y otras de Centro América, Sud África, y Cuba. Mediante un altoparlante, los centroamericanos le tocaron a los del lado opuesto una grabación de Carlos Puebla y sus Tradicionales cantando Llegó el Comandante y mandó a parar.
Los sucesos tomaron lugar sobre la importante Calle 16, misma que desemboca hacia al sur directamente en la Casa Blanca. Decenas de choferes que transitaban la escena tocaron sus bocinas en apoyo al grupo solidario, o gritaron consignas correspondientes. Uno, con notable acento en inglés, gritó “¡Viva Cha-véz!”
Informações de CubaDebate


sexta-feira, 21 de maio de 2010

Bope confunde furadeira com arma e mata morador de favela

Um cabo do Batalhão de Operações Especiais (Bope) matou nesta quarta-feira (19) um morador de uma favela do Andaraí, na Zona Norte, achando que o cidadão empunhava uma arma. A “arma”, no entanto, era apenas uma furadeira elétrica, que Hélio Ribeiro, de 46 anos, usava para pregar um todo em sua casa.

O caso ocorreu quando o Bope, que ocupa o Morro do Borel, na Tijuca, também na Zona Norte, foi à comunidade do Andaraí checar uma denúncia de que bandidos da vizinhança estariam escondidos ali.

Restante em Agência Diário

quinta-feira, 20 de maio de 2010

"Veja foi indispensável para construir o neoliberalismo"

A afirmação é da pesquisadora Carla Luciana Silva, que registrou em sua tese de doutorado o papel assumido pela principal revista do Grupo Abril na construção da hegemonia neoliberal no país.

A professora do curso de História da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) Carla Luciana Silva passou meses dedicando-se a leitura paciente de pilhas de edições antigas da revista Veja. A análise tornou-se uma tese de doutorado, defendida na Universidade Federal Fluminense, e agora, em livro. “Veja: o indispensável partido neoliberal (1989-2002)” (Edunioeste, 2009, 258 páginas) é o registro do papel assumido pela principal revista do Grupo Abril na construção do neoliberalismo no país.

A hipótese defendida pela professora Carla é que a revista atuou como agente partidário que colaborou com a construção da hegemonia neoliberal no Brasil. Carla deixa claro que a revista não fez o trabalho sozinha, mas em consonância com outros veículos privados. Porém, teve certo protagonismo, até pelo número médio de leitores que tinha na época – 4 milhões, afirma Carla em seu livro.

“A revista teve papel privilegiado na construção de consenso em torno das práticas neoliberais ao longo de toda a década. Essas práticas abrangem o campo político, mas não se restringem a ele. Dizem respeito às técnicas de gerenciamento do capital, e à construção de uma visão de mundo necessária a essas práticas, atingindo o lado mais explícito, produtivo, mas também o lado ideológico do processo”, afirma trecho do livro.

O livro pode ser adquirido diretamente com a autora, através do email carlalssilva@uol.com.br.


Sobre o título do livro, porque “indispensável”? É uma brincadeira com o slogan da Veja ou reflete a importância da revista para o avanço do neoliberalismo no Brasil?

O título é uma alusão ao slogan da revista e ao mesmo tempo nos lembra que ela foi um sujeito político importante na construção do neoliberalismo. A grande imprensa brasileira foi indispensável para que o neoliberalismo tenha sido construído da forma que o foi. A Veja diz ser indispensável para o país que queremos ser. A pergunta é: quem está incluído nesse “nós” oculto? A classe trabalhadora é que não.

Quais os interesses defendidos por Veja?

Os interesses são os dominantes como um todo, mais especificamente os da burguesia financeira e dos anunciantes multinacionais. Em que pese o discurso de defesa da liberdade de expressão articulado à publicidade, o que importa pra revista são os interesses em torno da reprodução capitalista. A revista busca se mostrar como independente, o que se daria através de sua verba publicitária. É fato que a revista tem uma verba invejável, mas isso não a transforma no Quarto Poder, que vigiaria os demais de forma neutra. Ao mesmo tempo em que ela é portadora de interesses sociais, faz parte da sociedade, a sua vigilância é totalmente delimitada pela conjuntura e correlação de forças específica. O exemplo mais claro são as denúncias de corrupção e forma ambígua com que Veja tratou o governo Collor, o que discuto detidamente no livro.

Isso significa defender atores e grupos específicos? E, ao longo dos anos, estes atores mudam?

Essa pergunta é mais difícil de responder, requer uma leitura atenta, a cada momento histórico especifico. A revista não é por definição, governista [no período estudado]. Ela é defensora de programas de ação. No período analisado (1989-2002), sua ação esteve muito próxima do programa do Fórum Nacional [www.forumnacional.org.br] de João Paulo dos Reis Velloso. Ela busca convencer não apenas seus leitores comuns, mas a sociedade política como um todo e também os gerentes capitalistas.

E que relação Veja estabelece com grupos estrangeiros?

Essa é outra pergunta que requer atenção e mais estudos. O Grupo Abril não é um grupo “nacional”. Suas empresas têm participação direta de capital e administração estrangeira. Primeiro, é importante ter claro que o Grupo Abril não se restringe a suas publicações. A editora se divide em várias empresas, sendo que a Abril é majoritariamente propriedade do grupo Naspers, dono do Buscapé [site de comparação de preços] e de empresas espalhadas pelo mundo todo, da Rússia à Tailândia. Essa luta pela abertura de capital [no setor das comunicações] foi permanente ao longo dos anos 1990 e a Abril foi o primeiro grande conglomerado [de comunicação] brasileiro a abrir seu capital legalmente. É bom lembrar que o grupo tem investido bastante também na área da educação, e por isso a privatização do ensino continua sendo uma meta a atingir.

Aconteceram várias edições do “Fórum Nacional” no período em que faz sua análise. Por que Veja defendeu com tanto afinco as resoluções, especialmente econômicas, saídas desse Fórum?

O Fórum Nacional tem vários títulos. Eles [os integrantes do Fórum] foram se colocando ao longo dos anos, desde 1988, como intelectuais que pensam o Brasil e defendem programas de ação – as formas específicas de construção de um projeto sócio-econômico, que mudaram ao longo dessas duas décadas. Não existe um vínculo orgânico da revista com o Fórum, ao menos não o comprovamos, mas existe uma afinidade de programa de ação. A tentativa de reforma da Constituição em 1993 foi um bom exemplo, conforme desenvolvo no livro.

No livro, você aponta que a Veja “comprou” as idéias no Fórum Nacional, transformando-as numa verdadeira cartilha econômica para salvar o Brasil no começo dos anos 90. Quais seriam os principais tópicos desta “cartilha”?

O Fórum Nacional surgiu em 1988 como uma forma de organizar o pensamento e ação dominante. Ele se constituiu um verdadeiro aparelho privado de hegemonia, buscando apontar caminhos para a forma da hegemonia nos anos 1990. E existe até hoje, fazendo o mesmo. Portanto, ele não é apenas uma fórmula econômica, mas de economia política. Tratou de temas relevantes como “modernidade e pobreza”, “Plano Real”, “Segurança”, “estratégia industrial”, “política internacional”, sempre trazendo intelectuais considerados “top” do pensamento hegemônico para ver, a partir de suas pesquisas, quais caminhos deveriam ser seguidos, não apenas pelos governos, mas também pela sociedade política, ditando os rumos da economia.

Essa “cartilha” econômica foi atualizada? Você se recorda de alguma campanha recente em que a revista tenha tomado a frente?

A atualização é constante, mas não é uma cartilha. O Fórum e a revista são independentes um do outro, ao que parece, não há um vinculo orgânico. Mas Veja assumiu várias campanhas, sendo a principal delas a manutenção do programa econômico de Fernando Henrique durante todo o governo Lula. A blindagem feita ao presidente Lula da Silva foi imensa, especialmente se compararmos com o que foi feito do caso do mensalão ao que ocorreu no governo Fernando Collor. O que explica isso parece ser claramente a política econômica [de FHC e reproduzida por Lula] que garantiu lucros enormes aos bancos e a livre circulação de capitais, além de outras políticas complementares.

Qual foi a importância da revista para a corrente neoliberal desde Collor? Dá para mensurar?

Foi muito importante, mas não dá pra mensurar. É importante que tenhamos claro que o neoliberalismo não é uma cartilha, por mais que se baseie em documentos como o Consenso de Washington, por exemplo. Ele não foi “aplicado”. Foi construído como projeto de hegemonia desde os anos 1980. A grande imprensa participou da efetivação de padrões de consenso fundamentais: as privatizações, o ataque ao serviço público, a suposta falência do Estado. É importante olharmos hoje, pós crise de 2008, para ver que muitos desses preceitos são defendidos como saída da crise.

Qual a importância de Veja para as privatizações?

Difícil medir dessa forma. Posso falar da importância das privatizações para Veja: elas precisavam acontecer de qualquer forma. E isso era um compromisso com o projeto que representava e com os seus interesses capitalistas específicos, do Grupo Abril. É bom lembrar que a criação de consenso em torno desse ideal foi importante para que o grupo pudesse abrir seu capital oficialmente ao capital externo.

Quer ler mais? Vá ao Brasil de Fato

quarta-feira, 19 de maio de 2010

FMI e governos da eurozona querem Grécia de exemplo

O "plano de resgate" adotado pela União Européia (UE) e o FMI pretende colocar durante três anos a Grécia sob abrigo da especulação dos mercados financeiros e impedir sua "quebra". Mas o jugo "euro-FMI" interdita debates e medidas democráticas que precisam ser impostas na Grécia e em toda a Europa: abertura dos livros contábeis (dos Estados, dos bancos, das empresas) e o balanço do fracasso da UE neoliberal, atestado pela corrida ao FMI.

Georges Panpandreu aceitou um plano de austeridade sem precedentes: em contrapartida de uma ajuda de 100 bilhões de euros em três anos, o Estado se compromete a economizar 30 bilhões. Os lucros e mercados financeiros não se tocam, enquanto os serviços públicos e os assalariados devem pagar todo o pato.
Do lado dos gastos, trata-se de lançar uma nova ofensiva contra os serviços públicos em educação e saúde (diminuindo um pouco os gastos militares muito acima da média da UE), mas estamos seguros de que a França, segundo fornecedor de armamentos a Grécia, verá suas encomendas preservadas. Está prevista uma contra-reforma nas aposentadorias, pior que a que ameaça a França. Os salários dos funcionários serão reduzidos e depois congelados; no setor privado, as demissões são facilitadas ao mesmo tempo em que se introduz uma renda mínima para os jovens (e os afastados há muito tempo que se virem para encontrar um emprego), o que multiplicará os "assalariados pobres"...
Pelo lado das receitas, as privatizações dos transportes e da energia agravam uma Europa anti-social e desastrosa ao meio ambiente. No plano fiscal, nada de tocar nos lucros e nas isenções da igreja ortodoxa, mas o imposto mais injusto, o IVA, será aumentado.
O recurso ao FMI e a financiamentos bilaterais pelos Estados membros tenta salvaguardar a arquitetura neoliberal da UE: ausência de fiscalização européia (o orçamento europeu tem teto de 1% do PIB), prioridade ao financiamento privado com livre circulação de capitais e os critérios "de Maastricht"(1). Reafirmados hoje, foram estabelecidos em 1992 para que a Alemanha pudesse renunciar ao marco alemão. O conjunto construiu uma UE cada vez mais assimétrica. Os países designados desrespeitosamente como PIGS (porcos em inglês) - Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha – são uma periferia da eurozona, tal qual a que fica aleste do continente. Os excedentes comerciais e a débil inflação de uma Alemanha que pratica deslocamentos ao leste e a austeridade salarial correspondem a uma maior inflação, déficits e endividamentos superiores em outras partes.

As consultorias e agências de risco "avaliam" esses desequilíbrios. As mesmas que elevavam às nuvens em 2007 o que depois todos viram ser "papéis podres" na crise dos subprimes, permitem-se infligir "notas ruins", das quais se amparam os mercados especulativos: Grécia, Portugal e Espanha são as mais frágeis – mas a Itália tem uma dívida superior à da Grécia e o déficit do Reino Unido supera os 10%. Dominique Strauss-Kahn e o Palácio do Elizeu grunhem contra essas agências que agravam a especulação sobre o euro. Mas os "especuladores" são particularmente os próprios bancos. Os da França e da Alemanha têm 80% da dívida grega. O Banco Central Europeu não tem direito de emprestar aos Estados, mas emprestou aos bancos quantias alucinantes a juros baixos em plena crise financeira. Esse dinheiro lhes serve hoje para emprestar, com um juro mais alto, aos Estados que acabam de decidir emprestar a Grécia, tirando um lucro de passagem.

O FMI e os governos da UE querem que a Grécia sirva de "lição" européia. Mas essa Europa deve ser rejeitada por mobilizações que imponham verdadeiras solidariedades e "critérios de convergência" que tenham por objetivo a subida dos níveis de vida e a proteção ao meio ambiente. A moeda o financiamento sob controle público devem estar a serviço da coesão social.
O "plano de resgate" a Grécia não ataca os lucros e as rendas financeiras sobre a dívida. Deve ser rechaçado porque é tão injusto quanto os planos do FMI em outras partes, além de ineficaz; a austeridade significa recessão, causa primeira do déficit-público sem fazer que cesse a especulação.

Os islandeses se negaram a pagar por uma quebra que não era deles, em um referendo realizado em março passado. Há que se negar a pagar dívidas sem auditorias, transparência e debate sobre tais dívidas.

Nota:

1) O déficit público abaixo de 3% do PIB e a dívida pública abaixo de 60% se referem ao orçamento do Estado, das coletividades locais e da seguridade social: política fiscal e aposentadorias estão no coração do que está em jogo. Mas a UE proibiu também os bancos centrais da eurozona de financiar os Estados.

Catherine Samary e Hugo Harari-Kermadec são do grupo de Trabalho Econômico do Novo Partido Anticapitalista Francês.

Retirado de http://www.vientosur.info/

Traduzido do espanhol por Gabriel Brito e publicado em português no Correio da Cidadania.

terça-feira, 18 de maio de 2010

André Singer: “Cabe ao PT politizar subproletariado”

Texto interessantíssimo, leia até o final.

Quem quiser ler o artigo “Raízes sociais e ideológicas do lulismo”, de André Singer pode baixá-lo, em PDF, aqui.



André Singer, cientista político e ex-porta-voz do governo, analisa o lulismo e a sua base social, o subproletariado


O artigo “Raízes sociais e ideológicas do lulismo”, do professor de ciência política da Universidade de São Paulo (USP), André Singer, é um dos primeiros trabalhos acadêmicos a avaliar a composição sóciopolítica desse fenômeno capitaneado pelo presidente mais popular desde a redemocratização do país.


Ex-porta-voz e secretário de imprensa do Palácio do Planalto (2003-2007), Singer considera que o lulismo é composto por elementos de esquerda e de direita. Sua principal base eleitoral, o subproletariado – trabalhadores de baixíssima renda –, deseja uma melhoria nas condições de vida, mas preza pela manutenção da ordem e delega a tarefa de executor das mudanças a uma autoridade política.


Com a crise política de 2005, Lula ganhou mais força entre esse segmento, fundamentalmente beneficiado por políticas sociais, enquanto perdia o apoio dos setores médios que acompanhavam pela mídia as denúncias de corrupção.


Em entrevista ao Brasil de Fato, Singer debateu as características do lulismo e aconselhou o PT a estreitar as relações com o subproletariado para incorporá-lo à esquerda.


Brasil de Fato – Para a Ciência Política, essa combinação de elementos de esquerda e de direita que compõem o lulismo é uma novidade?

André Singer – Acredito que seja uma novidade na história brasileira. Tenho a impressão de que é o primeiro momento em que essa fração de classe, que eu tenho denominado “subproletariado”, tem se estruturado como um ator político em torno de um projeto nacional. Nesse sentido, seria uma novidade no Brasil.
Essa combinação de elementos de esquerda e de direita tem a ver com essa diferença ideológica importante entre o proletariado e o subproletariado. Ao olharmos para a trajetória brasileira das últimas décadas, podemos perceber que o proletariado brasileiro deu sustentação ao PT,que foi uma proposta originalmente muito radical. O PT tem uma característica singular na história brasileira: ter se proposto a ser um partido explicitamente radical, numa cultura política marcada pela conciliação.
A proposta [de criação] do PT se estruturou no ambiente de um grande movimento social de trabalhadores – a onda de greves que começa em 1978. Depois, do ponto de vista eleitoral, o PT encontra eco na camada mais organizada do proletariado, mas, ao mesmo tempo, é sistematicamente rejeitado pelo subproletariado. Em pesquisas voltadas para o comportamento político, percebem-se resultados muito semelhantes. Há certa hostilidade às greves e aos sindicatos nesse setor de baixíssima renda, com renda familiar de até dois salários mínimos.
O subproletariado tem uma visão conservadora, mas não no sentido de rejeitar mudanças. Ele deseja mudanças importantes. Mas ele quer que essas sejam feitas sem prejuízo da ordem. Ou seja, essa valorização do conflito político que o PT fez é rejeitada pelo subproletariado, que espera mudanças feitas de cima para baixo, por meio de uma autoridade de Estado reforçada e sem ameaça à ordem. É essa configuração que leva a pensar na mistura de elementos de esquerda e de direita.



Se esse fenômeno é algo novo na política brasileira, então a comparação entre o lulismo e o getulismo (fenômeno ligado ao ex-presidente Getúlio Vargas) é equivocada?

Acredito que essa visão é, pelo menos, precipitada. Hoje em dia, há uma tendência de revisitar o getulismo e reavaliar o que ele significou. A primeira questão com relação a essa comparação é que hoje nós não sabemos muito bem o que foi exatamente o getulismo. Ele precisa ser reavaliado.
Em segundo lugar, não está claro qual é a ordem de mudanças que o lulismo pode vir a trazer. Não sabemos ainda se essa comparação é elucidativa. O Getúlio fez uma política social importante, mas foi voltada, sobretudo, aos trabalhadores urbanos. Uma característica do lulismo é que ele se dirige ao segmento de trabalhadores que ficou fora da perspectiva getulista. O subproletariado é o setor que ficou fora da CLT [Consolidação das Leis do Trabalho]. Assim, pode-se dizer que essa comparação talvez possa trazer mais confusão do que luz. Pois, nessa visão, misturam-se fenômenos com aspectos sociais diferentes.


O senhor partilha da tese apresentada pelo ex-ministro Tarso Genro, que coloca a candidatura de Dilma Rousseff como consequência do vazio partidário que acometeu o PT após a “crise do mensalão”?

Eu tendo a concordar com ele. Evidentemente, ele tem muito mais condições do que eu de fazer uma análise do PT. Estou tentando, agora, escrever uma continuação desse artigo do lulismo, mas voltado para o PT. Ainda não o concluí. Mas tendo a achar que essa análise faz sentido.

Ao mesmo tempo em que o lulismo incorpora elementos de direita, a base tradicionalmente conservadora à qual ele se dirige, o subproletariado, pode incorporar elementos de esquerda?

Creio que pode estar havendo uma lenta convergência entre o lulismo e o petismo. Essa convergência, se estiver ocorrendo, é obrigatoriamente lenta. Uma coisa é você identificar uma determinada liderança política – no caso, o presidente da República, que tem muita visibilidade – com um determinado projeto, que é o que conforma o lulismo. É muito mais difícil transformar isso numa identificação partidária. Uma vez criada essa identificação, ela demora a ser desfeita. É um processo lento de constituição e desconstituição.
Mas tendo a achar que, lentamente, setores do subproletariado podem estar começando a identificar o PT como o partido do presidente. A partir disso, se inclinam a votar nos candidatos petistas. Mas não me refiro a candidato à presidência da República, pois aí há uma relação direta com o presidente. Refiro-me aos candidatos proporcionais do PT.

Se essa lenta aproximação estiver em curso, é possível que, se o PT permanecer como um partido de esquerda, ele leve uma certa politização à esquerda para esses setores. O PT, hoje, tem uma escola nacional de formação política, que foi constituída depois do 3º Congresso [2007]. Essa escola está levando informações políticas a centenas de milhares de novos membros do partido, que podem, em parte, estar vindo desses setores sociais. Se, como eu acredito, essa informação que está sendo levada for fundamentalmente de esquerda, é possível que esteja ocorrendo um lento processo de politização de esquerda desses setores.

Em seu artigo, há uma frase em que Lula lamenta não ter tido o apoio das camadas de baixíssima renda. O fato de o PT ter conquistado a simpatia desse segmento apenas depois de ter acesso aos órgãos do Estado pode representar uma falha de organização do partido e dos movimentos sociais que o construíram?

Acho que não. A posição de classe que o subproletariado ocupa na sociedade torna a organização dele muito difícil. Não diria que é impossível, pois há o fenômeno do MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra], um movimento social importantíssimo que busca organizar esse setor. O fato de o MST existir, ter crescido e possuir uma estrutura nacional importante, mostra as possibilidades. Mas mostra também os limites. Porque sabemos que o MST organiza uma fração muito pequena desse setor que, em 2006, poderia ser até metade do eleitorado brasileiro. Esse quadro mudou com as políticas sociais, a formalização do emprego e o aumento do salário mínimo, que produziram uma transformação. Então, é possível que já estejamos diante de um quadro modificado.

Mas, sem dúvida, esse é um setor muito vasto da sociedade brasileira. Essa é uma característica importantíssima do Brasil. Então, não vejo falha nem no PT nem na esquerda por terem tido relativamente poucos avanços, ou avanços limitados. É quase impossível você organizar um desempregado. Toda a formulação de esquerda está sustentada na ideia de que, com o crescimento do proletariado, este seria uma força invencível. O proletariado fabril, por exemplo, teria uma vocação para a organização, pois a própria indústria e a produção o organizam. Agora, um desempregado, como ele pode ser organizado?

O termo clássico “lumpemproletariado” tem sido considerado pejorativo e caiu em desuso. Na sua opinião, o subproletariado seria o equivalente atual do “lumpemproletariado”?

Não. Há uma diferença importante. Esse termo [lumpemproletariado] tem uma carga negativa e está associado a setores marginalizados e que estão na ilegalidade ou transitam muito facilmente por ela. Esse não é o caso do subproletariado. A grande massa desse setor é composta por trabalhadores. Justamente por isso, não considero correto usar o termo “lumpen”, porque ele confunde. Esse termo foi criado por uma visão europeia, para outro tipo de sociedade, e referia- se a um setor que não encontrava espaço no trabalho formalizado. Esse grupo era muito reduzido. Não é o caso do Brasil, onde temos uma massa de trabalhadores que está nessa condição.

Sobre o contexto da esquerda pós-Lula, é possível afirmar que o PT, sendo um partido de esquerda, deve “disputar” o lulismo, para afastar os elementos de direita que o compõem?

Na minha opinião, caberia ao PT aproveitar a oportunidade para organizar e politizar esses setores. Isso passa por um item: continuar sendo um partido de esquerda. De fato, o PT se constituiu em torno da ideia de que a luta de classes deveria ter uma centralidade na luta política. Isso, de certa maneira, orientou o seu radicalismo, que foi uma opção política que ajudou muito o Brasil. O problema hoje do PT é tentar manter-se como partido de esquerda.
Hoje o partido convive com uma aproximação de um vasto setor social, que de modo algum pode ser desconsiderado, cujos interesses o proletariado deve ter a iniciativa de agregar. O interesse do subproletariado não é algo alheio ao projeto do PT. Ele quer mais igualdade, que é o projeto do petismo. O problema é a maneira de chegar lá, mas o objetivo final é comum. Em se mantendo à esquerda, o partido deveria buscar incorporar esse setor.

Em seu artigo, o ano de 2005 é tratado como chave para o realinhamento eleitoral do lulismo. Há a constatação de que, enquanto parte do eleitorado se atinha aos escândalos políticos midiáticos, outra sentia os benefícios das políticas sociais, como o Bolsa Família e os reajustes do salário mínimo. É possível afirmar que há uma cisão na opinião pública causada por diferentes formas de avaliar o governo?

Eu não gosto muito do termo “opinião pública”, pois ele é usado sem levar-se em consideração a sua origem, que vem de uma formação antiga, de um espaço público de debates, que, de certo modo, foi eliminado pelo progresso do capitalismo.

Eu prefiro dizer que a emergência do subproletariado fez com que o debate, que ocorria por meio da imprensa e atingia os setores médios, perdesse a importância relativa. E isso é um dado da nova situação. Há um aspecto interessante nesse fato, pois ele vai forçar todos os atores políticos a incorporarem as necessidades do subproletariado como uma prioridade. A meu ver, isso explica porque o candidato do PSDB, José Serra, já afirmou que não vai abandonar o Bolsa Família e que vai procurar formas de aumentar o programa. Com isso, o Bolsa Família está caminhando para se tornar um direito de todos os brasileiros que comprovarem que têm um rendimento abaixo de um certo mínimo. Isso é um direito importantíssimo, pois cria um piso, abaixo do qual a sociedade não aceita que nenhum brasileiro esteja.

Esse novo fenômeno tem essa potencialidade e me parece que está significando passos importantes na história brasileira. Quando isso for visto daqui a 50 anos, pode ser lembrado como um momento de uma inflexão importante. O Brasil tomou medidas para dar uma condição a milhões de brasileiros que estavam, de alguma forma, no terreno da desesperança.

Já que você citou o ex-governador Serra, gostaria que você comentasse uma declaração recente do ex-deputado Roberto Freire (PPS), que afirmou que a candidatura que representa o conservadorismo é a do PT, não a do PSDB, já que Dilma tem maior apoio nos grotões e no “Brasil mais atrasado”, onde há um conservadorismo histórico.

Não vi essa declaração do deputado Freire. É verdade que existe um aspecto conservador [na base eleitoral da candidatura do PT], pois há um apreço pela ordem e a valorização de uma mudança por cima. Mas, na candidatura do Serra, historicamente, não há nenhuma valorização do conflito político; e não parece que isso vá acontecer agora. Quem tem isso no seu passivo histórico é justamente o PT. Sabemos que o partido está em transformação, mas quem trouxe essa marca foi ele, não as forças que estão hoje alinhadas ao PSDB.

Original no excelente Brasil de Fato

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Eleições: os liberais ingleses, à esquerda da esquerda

Não foi surpresa a queda do Partido Trabalhista para um humilhante terceiro lugar nas pesquisas eleitorais inglesas. A incapacidade de Gordon Brown domar a crise, que atingiu a Inglaterra em cheio, pesou contra seu governo. Medidas tomadas nestes 13 anos dos trabalhistas no poder, como a participação destacada na guerra do Iraque, redução de salários (para aumentar a competitividade das exportações do país) e as leis anti-terror restritivas das liberdades, não pegaram bem num partido tradicionalmente associado à esquerda. Tudo isso culminando com a revelação de gastos escandalosos de parlamentares trabalhistas.

Como seria lógico, os conservadores aproveitaram-se da situação para se apresentar como a mudança que o povo britânico exigia.

Ninguém contava com a ascensão espetacular do Partido Liberal, mero coadjuvante da política inglesa desde o fim da 1ª. Grande Guerra, sempre bem atrás dos conservadores e trabalhistas que se revezaram no governo até hoje.

Ao noticiar a virada dos liberais que empataram com o Partido Conservador na liderança das pesquisas, a mídia brasileira ressaltou as qualidades pessoais do líder do PLD, Nick Clegg, comparando-o com Obama. Deu-se destaque ao seu carisma, juventude, facilidade de comunicação e à sua identificação com a “mudança”, tomando esta bandeira do Partido Conservador, na verdade, um partido do “establishment” que hoje pouco se diferencia do Partido Trabalhista.

É preciso, porém, considerar também a importância das idéias de Clegg no seu sucesso político. E aí a surpresa é talvez ainda maior.

A submissão à política externa dos Estados Unidos, especialmente a partir do fim da 2ª. Guerra Mundial, foi atacada de frente por Nick Clegg: “Cada vez que temos de tomar uma decisão, não temos escolha senão seguir as decisões tomadas na Casa Branca.” Ao contrário de seus concorrentes, ele quer que a Inglaterra passe a agir na área internacional conforme os seus interesses, não como um simples apêndice militar dos EUA.

Consubstanciando essa idéia, Clegg defende posturas concretas que contrariam os americanos em pontos fundamentais.

Foi contrário à invasão do Iraque, compartilhada por forças inglesas. Advoga uma postura imparcial no Oriente Médio, em lugar do apoio a Israel, adotado pelos governos trabalhistas de Tony Blair e Gordon Brown.

Antes do ataque a Gaza, em artigo no ‘The Guardian’, em janeiro de 2009, intitulado ‘Precisamos parar de armar Israel’, o líder liberal escreveu: “Brown precisa condenar sem ambigüidades as táticas de Israel como condenou os ataques de foguetes do Hamas”.

E mais adiante: “Ele (Gordon Brown) precisa liderar a Comunidade Européia para usar suas forças econômica e diplomática na região e mediar a paz. A Europa é de longe o maior mercado para exportação de Israel. Ela precisa suspender imediatamente o novo acordo de cooperação com Israel até que as coisas mudem em Gaza, apresentando condições firmes para assistência a longo prazo à comunidade palestina.”

Durante a guerra de Gaza, Clegg pronunciou-se assim: “Temos um presidente dos EUA de saída (Bush) sancionando a resposta militar israelense e um doloroso silêncio do presidente eleito (Obama). Temos uma União Européia comprometida por confusas mensagens... Gordon Brown, como Tony Blair, fez a política externa inglesa efetivamente subserviente a Washington. Apoio ao governo extremista de Israel não é nem do interesse da Inglaterra, nem do seu povo”.


Um ano depois da invasão de Gaza, quando a Europa e os EUA não condenavam o bloqueio de alimentos e materiais de construção pelo exército israelense, o líder liberal proclamava que “o confinamento e punição de toda uma população não é a forma de construir a paz para todo o povo do Oriente Médio”.

Nick Clegg foi mais além no trato de temas delicados para as relações EUA-Inglaterra. O manifesto de lançamento da sua candidatura diz que “queremos um completo inquérito judicial sobre a conivência do país nas torturas e nas ‘rendições extraordinárias’, nas quais suspeitos de terrorismo eram presos pela CIA no exterior e enviados a países para serem torturados secretamente”.

Lembro ainda mais outra posição liberal mal vista pela Casa Branca: Clegg é contra o Sistema de Misseis Trident, planejado ante a possibilidade de um ataque soviético. Para ele, já que a Guerra Fria acabou, não se deve manter o Trident a um custo de 120 bilhões de libras nos próximos 20 anos.


Mesmo arriscando perder votos de uma população fortemente anti-imigração, o líder liberal defende a anistia dos emigrantes ilegais há 10 anos no país, ao contrário das medidas duras propostas por seus adversários, inclusive os trabalhistas.
Coerente com as tradições liberais inglesas, ele quer ainda, através de uma “freedom bill” (lei da liberdade) restaurar a proteção às liberdades civis fraturadas pelas medidas anti-terrorismo do período Brown.
Por fim, o princípio aplicado aos bancos do “too big to fail” (muito grandes para falir), por receio das implicações na economia, fielmente respeitado por trabalhistas e conservadores, é repudiado por Nick Clegg. Ele garante que, se eleito, não impedirá a quebra de grandes bancos fraudadores.
O fato dos liberais ingleses estarem hoje à esquerda dos trabalhistas não quer dizer que eles tenham virado um partido esquerdista ou anti-americano. Seu programa de corte de despesas pode implicar em redução de benefícios sociais. E ele apóia tanto a guerra do Afeganistão (criticando sua condução) quanto sanções contra o programa atômico iraniano, embora excluindo ações militares.
Mesmo assim uma eventual vitória de Nick Clegg mudaria muita coisa, implicaria inclusive numa revolução inglesa na política externa, libertando o país da dependência a Washington.
No entanto, devido ao sistema de eleições inglês, com a divisão do país em 650 distritos, cada um elegendo um parlamentar, os liberais não têm chances, pois seus votos estão demasiadamente concentrados.
Certamente, nenhum dos dois grandes partidos elegerá um número de representantes que o capacitem a governar sozinho. A aliança com os liberais será inevitável, e assim terão influência no governo.
Que isso poderá implicar em alguma “mudança” na política externa inglesa é algo que não pode ser descartado.

Escrito por Luiz Eça no Correio da Cidadania

Por que o Irã não pode ter a bomba atômica?

O Ocidente, que jamais criticou o arsenal nuclear de Israel e jamais criticou os países que possuem tais arsenais,  responde: “Porque o Irã não está preparado para viver no seio das nações civilizadas”.

Mas o que o Irã pode fazer que o Ocidente já não fez?

A Inquisição?
Isso o Ocidente civilizado já fez.

Ocupar, saquear e transformar o continente africano em colônia?
Isso o Ocidente civilizado já fez.

Ocupar, saquear e colonizar o continente asiático?
Isso o Ocidente civilizado já fez.

Provocar a Primeira Guerra Mundial?
Isso o Ocidente civilizado já fez.

Provocar a Segunda Guerra Mundial?
Isso o Ocidente civilizado já fez.

Lançar bombas atômicas sobre Hiroshima?
Isso o Ocidente civilizado já fez.

Jogar a bomba atômica sobre Nagasaki?
Isso o Ocidente civilizado já fez.

Invadir o Iraque, saquear suas riquezas e destruir mais de 35 mil sítios arqueológicos?
Isso o Ocidente civilizado já fez.

Invadir o Afeganistão e não deixar pedra sobre pedra?
Isso o Ocidente civilizado já fez.

Ocupar e transformar a belíssima Guantánamo cubana num centro de tortura?
Isso o Ocidente civilizado já fez.

Saquear as riquezas das Américas do Sul  e Central?
Isso o Ocidente civilizado já fez.

Construir um muro em Israel para segregar os semitas palestinos?
Isso o Ocidente civilizado já fez.

Financiar os principais cartéis de drogas de todo o mundo para dar uma sobrevida a Wall Street?

Isso o Ocidente civilizado já fez.

Realmente, o Ocidente tem razão. O Irã não está preparado para viver no seio das nações civilizadas...
 
 Retirado do excelente Blog Cidadã do Mundo

domingo, 16 de maio de 2010

Somália: Uma crise humanitária estratégica

Vítima de constantes e desastradas intervenções militares externas, país do “chifre africano” afunda em ciclo de fome e violência de proporções inéditas

Conflito envolve diversas forças e interesses

O RPG, abreviação em inglês de lançador de granadas em foguetes (rocket-propelled grenade), é semelhante a uma bazuca. Colocando-o no ombro, o atirador dispara um foguete explosivo não muito preciso, mas capaz de perfurar blindagens e causar enorme dano.

Foi com um desses que, em 1993, em meio a um dos inúmeros combates da guerra civil que dividiu a Somália a partir de 1991, um helicóptero dos Estados Unidos foi derrubado em Mogadíscio, a capital do país. O episódio ficou famoso ao inspirar o filme “Falcão Negro em Perigo” (Black Hawk Down), de 2001.

Hoje, 19 anos depois, a guerra civil ainda não terminou e o uso de RPGs e metralhadoras em áreas urbanas virou uma constante diretamente relacionada ao altíssimo número de mortes de civis nos combates.

Neste ao, no entanto, não há estimativa. Entre 10 e 12 de março, por exemplo, foram recolhidos mais de 80 corpos das ruas da capital. De acordo com analistas internacionais e integrantes de grupos de ajuda humanitária que atuam há anos na Somália, a situação nunca foi tão crítica.

Fugas em massa

O agravamento dos conflitos vem provocando fugas em massa de somalianos tentando sobreviver. Só em março, mês marcado por batalhas violentas, 270 mil deixaram a região de Mogadíscio, fazendo com que o número de deslocados internos passasse de 1,5 milhão – o equivalente à população de uma cidade do tamanho de Recife (PE). “Alguns foram hospedados por amigos ou parentes, mas muitos simplesmente não têm condições de fugir para áreas mais seguras. A situação é alarmante. Já empobrecidos por anos de conflitos e expulsos de casa, eles estão rapidamente ficando sem meios de sobrevivência”, resume a porta-voz do Alto Comissário das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), Melissa Fleming.

Aos desabrigados internos, que vagam pelo país fugindo das áreas mais caóticas, somam-se mais de 560 mil refugiados que buscaram abrigo em campos superlotados na Etiópia, Quênia, Djibuti e Eritréia, países vizinhos.

Fome

Além da violência, a fome é uma constante e atinge principalmente mulheres e crianças. A estimativa do Programa de Alimentação da Organização das Nações Unidas é de que 2,5 milhões de pessoas dependam do envio de comida, o equivalente à população de uma cidade do tamanho de Brasília (DF).

Destes, 625 mil vivem em regiões em que a distribuição foi interrompida em janeiro. A ONU suspendeu a atuação no sul e em partes da região central alegando não haver o mínimo de segurança e ser impossível atender as exigências dos grupos que controlam a área.

Ao mesmo tempo em que a distribuição de alimentos vem sendo comprometida, a própria organização se vê tendo que dar explicações após denúncias do Grupo de Monitoramento da ONU de desvios de alimentos e corrupção. Pessoas contratadas pelo Programa de Alimentação teriam participado inclusive de comércio de armas.

Uma em cada seis crianças somalianas sofre de desnutrição. Na região que deixou de ser atendida, a média sobe para uma em cada cinco crianças.

Armamento pesado

Apesar da crise humanitária gravíssima em curso na Somália, as agências internacionais de notícias dão mais atenção à pirataria no golfo de Aden do que às mortes constantes de civis. A instabilidade no país afeta o principal eixo de ligação entre o mar Mediterrâneo, que banha a Europa e é caminho para o Atlântico Norte, e o oceano Índico, rota para a Ásia e para o golfo Pérsico e suas reservas de petróleo.

De acordo com a Organização Marítima Internacional, por ano, cerca de 22 mil cargueiros atravessam o golfo de Aden, passando pelo canal de Suez, no Egito, que liga o Mediterrâneo ao mar Vermelho. Tal movimentação representa aproximadamente 8% do comércio mundial e inclui mais de 12% do petróleo transportado por via marítima no mundo.

A Somália, com três mil quilômetros de costa (veja mapa nesta página), tem posição estratégica no principal eixo de ligação da importante rota de escoamento de boa parte do petróleo que abastece os países do Norte e numa das principais rotas de acesso aos mercados da Índia e China, países com um constante crescimento do nível de consumo de suas populações que, somadas, chegam a 2,5 bilhões de pessoas.

Posição estratégica

Portanto, mais do que as reservas de petróleo e gás ainda não exploradas que o país possui, é a posição estratégica no chamado Chifre da África que atrai a cobiça internacional. Não é à toa que os Estados Unidos mantêm, há anos, uma política agressiva na região.

Especialistas apontam que o caos atual é resultado direto das intervenções constantes e desastradas, ao longo dos anos, de governos poderosos, muitas apresentadas como “missões de paz” ou “intervenções humanitárias”.

“A Somália virou um tabuleiro de xadrez com diferentes grupos sendo usados por países que têm diferentes interesses. Eles armam facções rivais e prolongam a anarquia e a guerra civil”, explica o analista somaliano Ismail Adan Mohamed, que hoje vive em Dubai, nos Emirados Árabes. “Os Estados Unidos têm apoiado o governo transitório, que é fraco e obscuro. As armas que fornecem são vendidas abertamente nos mercados de armas de Mogadíscio e abastecerá a guerra civil e o sofrimento por mais anos e anos”, denuncia.


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