A OEA CONTRA CUBA
Em 18 de março de 1959, dois meses e meio depois da vitória popular de 1º de janeiro, o novo embaixador de Cuba na Organização dos Estados Americanos, Raúl Roa García, expressou a posição que definiu a relação entre a triunfante Revolução e o organismo hemisférico: (...) Em longos anos não se tinha levantado e escutado a voz genuína de Cuba no Conselho da OEA (...) É bom lembrá-lo pela sua novidade histórica e pelo óbvio estímulo aos povos ainda oprimidos. O derrubamento de uma tirania mediante a luta armada não é um fato insólito na nossa América, no entanto, a que derrubou a tirania de Fulgencio Batista, sim é.
Esta posição cubana partia do conhecimento de sua liderança revolucionária sobre a breve e triste história da OEA nessa época, a serviço dos EUA, que desde 1959 projetou um plano para utilizar a organização contra a Revolução e contra o nosso povo. Até esse momento, nenhum mecanismo multilateral ou regional tinha feito ou tentado fazer mais dano a um país que o que a OEA impôs a Cuba.
A denominada "questão cubana" ocupou lugar prioritário na agenda da OEA e, segundo os interesses dos EUA, começou a colocar as bases para o isolamento político-diplomático de Cuba e a ativação do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), para tentar "legitimar" uma agressão militar direta contra Cuba.
Em agosto de 1959, os governos do Brasil, Chile, Estados Unidos e Peru, fizeram a convocatória para uma Reunião de Consulta de Ministros das Relações Exteriores para abordar a situação no Caribe. A Revolução cubana havia promulgado a Primeira Lei de Reforma Agrária, eliminando os grandes latifúndios, entre os quais, os da United Fruit, onde tinham interesses econômicos os irmãos Allan Dulles, secretário de Estado e Foster Dulles, chefe da CIA.
A 5ª Reunião de Consulta, em Santiago do Chile, não adotou nenhum documento condenando nosso país, mas criou o "âmbito conceitual" que serviria aos propósitos da política ianque contra o nosso país, estabeleceu a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Comissão Interamericana de Paz recebeu novas faculdades, o qual fazia parte da estratégia de criação ou aperfeiçoamento de ferramentas para a aplicação de diretivas ianques contra Cuba no seio da OEA.
Efetuaram-se várias reuniões e Roa, prevenido dos objetivos desses encontros sobre o Caribe, declarou, primeiro em Washington: O governo de Cuba tem certeza de que todas essas acusações visam (...) criar um ambiente internacional hostil, e organizar em Cuba uma conjura internacional de tipo intervencionista, para intervir, obstaculizar ou fazer fracassar o desenvolvimento da Revolução Cubana. Depois, em San José, reafirmou suas palavras com uma acusação reveladora: Se o objetivo é fazer justiça, deveriam sancionar-se, conjuntamente, Trujillo e o governo dos Estados Unidos.
CONJURA E VINDICAÇÃO EM SAN JOSÉ
De 22 a 29 de agosto de 1960, teve lugar em San José, Costa Rica, a 7ª Reunião de Consulta. Entre os pontos da agenda, aparecia o fortalecimento da solidariedade continental e do sistema interamericano, especialmente diante das ameaças de intervenção extraterritorial, e a consideração das tensões internacionais existentes na região do Caribe, para garantir a harmonia, a unidade e a paz da América, e outros.
A reunião adotou uma Declaração que nos seus parágrafos operativos 4 e 5 assinalava:... o Sistema Interamericano é incompatível com toda forma de totalitarismo e a democracia somente conseguirá a realização de seus objetivos no continente quando todas as repúblicas americanas adequem sua conduta aos princípios enunciados na Declaração de Santiago do Chile e todos os Estados-membros da organização regional têm a obrigação de se submeter à disciplina do sistema interamericano, voluntária e livremente acertada e que a firme garantia de sua independência política procede da obediência às disposições da Carta da Organização dos Estados Americanos.
Em San José ficaram estabelecidas as condições necessárias, conforme os termos ianques, para impor a exclusão do governo cubano. À maneira de protesto, ao anunciar a decisão de se retirar daquele vergonhoso conciliábulo, o chanceler Roa sentenciou com uma memorável e contundente frase a ruptura definitiva com a OEA: (...) Os governos latino-americanos deixaram Cuba sozinha. Vou embora com meu povo, e com meu povo vão embora também os povos da nossa América.
Em resposta aos resultados da reunião de San José, mais de um milhão de cubanos reunidos na Praça da Revolução, numa histórica Assembleia Geral do Povo de Cuba, adotaram a Primeira Declaração de Havana, mediante a qual foram rechaçadas as pretensões hegemônicas dos EUA contra Cuba, sua política de isolamento contra nossa nação e o servilismo da OEA ante essas patranhas.
Existe uma questão técnica jurídica interessante muito bem analisada pela Cláudia Antunes na Folha de ontem: a Carta da OEA.
ResponderExcluirNo art. 3º da Carta está dito:
"Elementos essenciais da democracia representativa incluem o respeito pelos direitos humanos e as liberdades essenciais, acesso ao e exercício do poder de acordo com o Estado de Direito, a realização de eleições periódicas livres e justas baseadas no voto secreto e no sufrágio universal como expressão da soberania popular, um sistema pluralista de partidos políticos e organizações, e a separação dos Poderes".
Como se vê, Cuba não se encaixa nesse perfil. Quer se integrar? Que mude seu sistema político e representativo.
A Carta dá ênfase, e com razão, à democracia representativa. Os países da ALBA (Venezuela, Bolívia, Cuba e Equador) torcem o nariz para democracia representativa, preferem a democracia participativa. A voz das minorias participativas.
No artigo 4º, a Carta prega que "a transparência em atividades do governo, probidade, administração pública responsável da parte dos governos, respeito aos direitos sociais e liberdade de imprensa são componentes essenciais do exercício da democracia".
Este é outro ponto que em Cuba não existe: transparência nas atividades do governo e a liberdade de imprensa.
Apenas superando esses pontos é que Cuba poderá se integrar a OEA.
O que não é admissível é que a OEA modifique sua Carta apenas porque os populistas de plantão querem porque querem. Não se pode admitir -- e devemos estar em alerta -- para qualquer hipótese de flexibilização de conceitos que não podem e nem devem ser flexibilizados. O que está dito na Carta não pode ser modificado, seria um retrocesso.