domingo, 27 de junho de 2010

A anatomia do medo - Artigo de Immanuel Wallerstein

O medo não é irracional. É a consequência da crise estrutural do sistema-mundo. 

O medo é a mais universal emoção pública na maioria do mundo actual. Este medo não é irracional, mas não conduz necessariamente a formas sábias de lidar com os presumíveis perigos. O modo como actua pode ser claramente compreendido em dois acontecimentos importantes do passado recente. O primeiro foi a dramática queda da Bolsa de Valores de Nova York a 6 de Maio deste ano – uma queda que espantou a todos e durou apenas poucos minutos. O segundo foram as revoltas em Atenas, que já causaram três mortes e que continuam.
O que aconteceu na Bolsa? Parece que, naquela manhã, a média do Dow Jones industrial caíra cerca de 300 pontos. Foi uma descida considerável (cerca de 3%), mas que não parecia uma reacção incomum a uma combinação de más notícias em várias frentes nos Estados Unidos, a que se juntaram as crescentes incertezas sobre as probabilidades de a Grécia evitar a bancarrota.
Mas, de repente, no fim da tarde, o Dow caiu mais 700 pontos com rapidez incrível. Foi a maior queda de transacções jamais registada num só dia. Ninguém a previu, e aparentemente deixou os operadores estupefactos. Algumas acções importantes caíram 90% e passaram a valer um cêntimo. Então, os operadores “assistiram, boqueabertos”, e quase com a mesma rapidez que acontecera a queda, ao Dow a subir de novo, terminando com uma perda de “apenas” 371,80 pontos – para o aparente alívio dos operadores do mercado.
Evidentemente que todos procuraram uma explicação. A primeira fornecida foi que um único operador tinha um “dedo gordo” e pode ter introduzido uma operação de milhares de milhões, quando o que queria eram milhões. O problema com esta explicação foi que ninguém conseguiu localizar esta pessoa ou demonstrar que ele existe ou teve, de facto, um “dedo gordo”.
Começou então a circular uma explicação alternativa. A Bolsa de Nova York tem um mecanismo de desaceleração quando as operações parecem estar demasiado rápidas. Mas outras bolsas não têm o mesmo mecanismo. Assim, dizem alguns, os operadores, diante da desaceleração da Bolsa de Nova York, decidiram transferir as operações para outras bolsas. Alguns sugerem outra variante desta explicação: a culpa foi das chamadas estratégias algorítmicas de operação, que envolvem mecanismos automáticos de compra e venda pré-programados para fazer essa transferência. A falta de coordenação entre as várias bolsas, diz-se, é culpa dos regulamentos, e agora alguns argumentam que todas as bolsas deveriam ter mecanismos de desaceleração conjuntos. Para outros, a queda pode ter sido causada por um mecanismo automático, assim não se pode culpar máquinas em vez de pessoas.

Leia o restante no site do Bloco de Esquerda (Portugal)

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