Um dos jovens revolucionários que aplaudiram a
vitória de Fidel Castro, no final dos anos 1950, falava português e
cresceu numa célula clandestina contra a ditadura de Fulgêncio Batista.
Filho de um português que fugiu nos anos 1940 ao
regime salazarista, Ismael Mendes Baulet desde cedo se viu envolvido em
política, já que a sua casa foi transformada em local de resistência à
ditadura.
O pai, Adelino Mendes, antigo piloto marítimo,
juntou-se à resistência e o filho cresceu entre propaganda comunista e
esconderijos, em fuga da polícia do regime.
Agora, Ismael Mendes Baulet junta nos seus 67
anos de vida uma carreira na defesa do regime castrista. Engenheiro de
avião e técnico de motor e fuselagem das Forças Armadas Revolucionárias
de Cuba, combateu na crise dos mísseis de 1962 e, ainda agora, não se
arrepende do país que ajudou a construir.
"A minha infância foi a de um menino pobre, num
bairro obreiro, brincando, indo à escola pública porque os meus pais
sempre se preocuparam com a nossa educação”, recorda.
No tempo de Batista, “éramos meninos e sabíamos
tudo o que estava acontecendo, porque na minha casa haviam reuniões, o
meu tio era funcionário de propaganda e agitação do Movimento 26 de
Julho (liderado por Fidel Castro) e o meu pai e a minha mãe pertenciam a
uma cédula clandestina".
"Tive uma infância muito pobre, não tinha
brinquedos, uma que outra vez o meu pai ‘apertou as calças’ e
conseguiu-me um carrinho ou uma bota de futebol. Éramos modestos, agora
há muita gente que só pensa no consumo", salienta Ismael Mendes Baulet.
Quando era jovem, o lusodescendente recebeu
"instrução militar" e participou mesmo naquele que foi um dos momentos
de maior tensão militar durante a Guerra Fria.
“Estava na bateria antiaérea na Crise de Outubro
(nome dado pelos cubanos à Crise dos Mísseis de Cuba de 1962) e
disparávamos aos aviões americanos, que passavam rasantes e tiravam
fotografias".
Casado com uma engenheira eléctrica, Ismael
Mendes Baulet tem dois filhos, licenciados em engenharia hidráulica e
economia, mas a quem sempre transmitiu os valores que aprendeu com o pai
e com os castristas: "lutar a favor da humanidade e contra o que
prejudique a classe que nos deu vida, nos viu nascer e criou".
"Esses princípios são os que o meu pai tinha e eu
nunca o trairei", assegura o revolucionário, que se mostra crítico da
posição dos Estados Unidos.
A América promove uma “política de rumores contra
Cuba”, porque “não lhes convém que se divulgue a verdade do que
acontece aqui", acusa.
Apesar disso, Ismael Mendes Baulet diz gostar
muito de filmes americanos, principalmente ‘westerns’, e agradece à
vizinha Venezuela "pelo cabo" que permite à população cubana o acesso à
Internet.
Em Portugal, já esteve por duas ocasiões e já obteve a cidadania nacional, mas quanto ao futuro, esse é em Cuba.
O pai, nascido na Lousã, foi condecorado a título póstumo, em 1979, pela sua participação na Revolução cubana.
Mas foi em Portugal que os pais se conheceram. A
sua mãe, uma cubana de origem francesa, era também militante do Partido
Comunista Português. Os dois fugiram de Portugal nos anos 1940, depois
de o pai ter participado numa insurreição a 08 de Setembro de 1936,
promovida pela Organização Revolucionária da Armada, também conhecida
como a “Revolta dos Marinheiros”.
O destino foi Cuba, devido às raízes da
progenitora. Mas, à chegada, confrontaram-se com um regime ainda mais
violento que o salazarismo, pelo que a opção pela resistência foi
“natural”, explica Ismael Mendes Baulet.
"Os nossos pais inculcaram-nos muito o amor a
Portugal e a Cuba, nunca puseram de lado nem a parte cubana nem a
portuguesa e obrigavam-nos a falar em português" em casa, diz Ismael.
Agora, com a passagem dos anos, Ismael Mendes Baulet já "fala pouco mas entende muito bem" o português.
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