Valter Pomar, um historiador brasileiro que ocupa a Secretaria de Relações Internacionais do Partido dos Trabalhadores (PT) faz um paralelo entre o que está acontecendo com a esquerda européia e a latino-americana.
“Enquanto no velho continente, a esquerda está em descenso, por aqui está em acenso. Isto significa que o papel dos movimentos sociais, os partidos de esquerda, os parlamentares, permitiram que acumulássemos força e chegássemos até o final dos anos 90 e no começo dessa década com um grupo de governos progressistas como nunca tivemos em nossa história da América Latina".
Apesar da experiência do Foro de São Paulo ter sido exitosa desde que o Partido dos Trabalhadores do Brasil impulsionou sua fundação nos anos 1990, “não podemos ficar tranquilos porque a direita está retomando o contra-ataque”.
“Os governos devem ser instrumentos de transformação profunda de nossas sociedades e há muito que fazer na perspectiva nacional da integração”, afirma Pomar que esteve em Bogotá entre 25 e 27 de novembro participando da celebração do 5º aniversário do Pólo Democrático Alternativo (PDA), ocasião em que presidiu a mesa de trabalho do Foro de São Paulo nessa cidade.
O Pólo, um aliado fundamental para a esquerda latino-americana
Ao expressar sua felicitação ao PDA pelos seus cinco anos de luta política na Colômbia, o porta-voz do Foro de São Paulo disse que o trabalho desse partido é importante e fundamental para a América Latina, porque contribui para consolidar a ação da esquerda na região.
Afirmou que não se pode deixar intimidar com as ameaças da direita sobre os setores democráticos e progressistas como o Pólo, pois essa estratégia sistemática é utilizada por parte do adversário para debilitar e aniquilar. No caso do Brasil com o Partido dos Trabalhadores, com muita frequencia a direita disse que estava acabado, aniquilado, mas o certo é que nas eleições presidenciais de outubro voltou a ganhar à presidência com Dilma Rousseff.
Como qualquer partido político que se respeite, “no PT também temos cisões e apesar disso, continuamos crescendo em grande medida porque nosso imperativo é a unidade e porque além disso existe uma grande pressão das bases”.
Pomar afirmou que a esquerda latino-americana tem um aliado fundamental no Pólo para contra-atacar as intenções obscuras do bloco da direita que opera contra a integração latino-americana e os direitos dos povos, mais ainda quando os Estados Unidos tem a Colômbia como sua ponta de lança para consolidar sua posição hegemônica.
Sobre os “latifúndios midiáticos” na América Latina, diz que esquerda latino-americana “é criticada mais por seus acertos do que por seus erros”.
Estados Unidos e sua decadência de longa duração
Sobre o enfraquecimento da hegemonia dos Estados Unidos afirmou que “é um processo de decadência de longa duração que ainda irá causar muitos estragos. Porque não aceitarão caírem sem manter sua presença, sua força e irão fazer de tudo para reverter esse processo. Isto significa que precisam recuperar o controle sobre o que consideram o seu “quintal”. Por isso é que não houve nenhuma alteração real da política de Obama em relação à Bush para a América Latina. Entretanto, encontram muita dificuldade, porque estão enfrentando uma correlação de forças muito diferente da que existia trinta anos atrás com uma capacidade econômica debilitada e com a liderança do Brasil como força econômica e política."
“O Estados Unidos no fundo o que aspira é que o Brasil seja um sócio menor para se manter no controle da região. Mas o Brasil não aceita essa subordinação, porque o que deseja é a integração da América Latina”.
Os desafios do governo de Dilma Rousseff
O Observatório Sociopolítico Latino-Americano – www.cronicon.net– conversou com Pomar sobre os desafios do PT com o novo governo do Brasil que a partir de 01 de janeiro de 2011 terá no poder a economista Dilma Rousseff.
Observatório Sociopolítico Latino-Americano : O que significa para o Partido dos Trabalhadores (PT) depois de oito anos de mandato de Lula da Silva, um novo governo sob a liderança de Dilma Rousseff?
Valter Pomar: Significa um reconhecimento da maioria dos brasileiros no sentido de que o PT realizou um governo exitoso no que se refere a democracia, a mudança de melhoria na vida do povo. Por outro lado, a vitória de Dilma Rousseff significa um desafio porque quando tomar posse do governo no próximo dia 01 de janeiro enfrentará uma realidade internacional diferente da que Lula em seus oito anos. Não será um governo de continuidade porque para que seja melhor terá que ser diferente.
Observatório: O desafio do PT é agora o de institucionalizar-se mais e deixar de ser “lulista”. O fenômeno de Lula da Silva não é caudilhista?
Pomar: Isto tem algo de verdade e algo de mentira. Lula é produto do PT e chegou à presidência graças a este partido. O lulismo surge a partir do momento em que camadas populares que antes não viam o PT com simpatia passam a apoiá-lo e votam nele. O fenômeno então não é como em outros países em que aparece um caudilho que cria um partido. No caso de Lula, existe um partido que projeta um personagem e que após 22 anos de luta chega ao governo e ganha autoridade porque consegue amplo apoio em sua gestão.
O desafio que temos é que esses setores que apóiam Lula passem a respaldar o PT. A direita dizia que no Brasil o PT tinha apenas a opção de eleger Lula e agora ganhamos a eleição presidencial com outra pessoa, o que mostra que nosso partido tem identidade e força própria.
Observatório: Um sociólogo brasileiro , Ricardo Antunes, disse faz pouco tempo em Bogotá que o governo de Dilma Rousseff em continuidade com o de Lula da Silva, entre outras coisas, continuará mantendo algumas políticas neoliberais que o PT nesses oitos anos não mudou e preferiu continuar com a herança do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Qual é a sua opinião?
Pomar: Não estou de acordo com essa percepção de Antunes. Faz alguns meses participei de um debate com o grupo de Antunes e lhes fiz uma pergunta muito simples: me diga uma coisa: a vida do povo brasileiro melhorou ou piorou? Hoje temos mais ou menos neoliberalismo no Brasil? E eles ficaram quietos porque sabem que a vida do povo melhorou e hoje temos menos neoliberalismo.
Eles podem acusar o governo de Lula ou o PT de adotar uma estratégia lenta e gradual que faz muitas concessões, mas falarmos de neoliberalismo é uma besteira, porque se fosse assim, o Brasil seria mais neoliberal que há oito anos e acontece exatamente o contrário. Tanto é assim que quando aconteceu a crise internacional de 2009 nós fomos quem menos sofremos.
Se fossemos um governo neoliberal estaríamos quebrados. Então não é que não existam políticas neoliberais porque toda a America Latina ainda está sob a hegemonia neoliberal ou que não exista continuidade em alguns aspectos, mas fazer uma generalização como a faz Antunes e outros intelectuais é se desligar da realidade concreta.
Observatório: O governo Lula da Silva tem dito que aposta na integração latino-americana, entretanto, alguns países da região acusam o Brasil de estar pondo freio na concretização do Banco do Sul…
Pomar: O projeto do Banco do Sul será concretizado, o que existe é uma diferença entre os governos progressistas que fazem parte da UNASUL sobre a natureza dos mecanismos de integração. Nós avaliamos que uma instituição como o Banco do Sul deve ter sustentabilidade e por isso não pode ser constituído de maneira rápida. Como será o aporte de capital? Como será a votação? Será por aporte de cada país?
Se trata de construir um mecanismo que evite o que acontece com o Banco Mundial, cuja muitas decisões não se adotam através do mecanismo de um país,um voto. Por tudo isso existe uma discussão que tem que acontecer para se criar uma instituição que funcione e que no curto prazo não entre em crise.
Fonte: Vermelho